A morte de Guilherme Dias Santos Ferreira, de 26 anos, virou símbolo de como falhas graves em abordagens policiais podem devastar famílias inocentes. A Justiça de São Paulo decidiu, em 12 de julho de 2025, reclassificar o caso para homicídio doloso, atendendo pedido do Ministério Público. Antes, a denúncia era por homicídio culposo, quando não há intenção de matar, mas agora o policial Fábio Anderson Pereira de Almeida, de 35 anos, vai responder por agir deliberadamente.
O caso aconteceu no início do mês em Parelheiros, zona sul da capital paulista. Guilherme, negro, trabalhador de marcenaria e em uma fábrica, voltava para casa após fazer hora extra. No trajeto até o ponto de ônibus, acabou sendo fatalmente confundido com um suspeito de assalto por um policial à paisana que havia passado por uma tentativa de roubo minutos antes na Estrada Ecoturística.
Pereira, que seguia de moto, acreditou reconhecer em Guilherme um dos assaltantes que tentaram abordá-lo e atirou, atingindo-o na cabeça. A partir daí, toda a narrativa policial começou a ser desmontada por provas concretas de que Guilherme sequer tinha relação com o crime que ocorrera minutos antes no local.
O que desmontou qualquer dúvida quanto à inocência de Guilherme ficou escancarado nos itens coletados com ele: uma Bíblia, marmita, remédios e objetos pessoais, tudo compatível com a rotina de quem só queria chegar em casa. Não foi encontrada nenhuma arma, nem qualquer indício de ação criminosa. Testemunhas e imagens de câmeras de segurança reforçaram essa versão. A esposa da vítima também confirmou aos investigadores que Guilherme nunca se envolveu em crimes, tampouco conhecia qualquer um dos autores da tentativa de roubo ocorrida anteriormente.
Pereira foi preso em flagrante no mesmo dia. No entanto, ficou em liberdade pouco depois, ao pagar fiança de R$ 6.500. A polícia afastou o agente das funções operacionais, mas foram as movimentações do Ministério Público e da família de Guilherme que aceleraram a reviravolta no caso. O Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), responsável pela investigação, encontrou elementos que apontaram para uma conduta consciente: mesmo diante de um cenário caótico, o policial decidiu atirar contra um homem desarmado que, segundo a acusação, não representava ameaça.
O episódio acendeu, de novo, o debate sobre o racismo estrutural na abordagem policial. Parentes, vizinhos e movimentos sociais passaram a pressionar por justiça, enfatizando que a cor da pele de Guilherme foi determinante para o desfecho trágico. Para diversas entidades, a rápida criminalização da vítima e a postura do Estado em casos similares evidenciam a urgência de rever protocolos policiais e práticas de identificação de suspeitos.
O processo vai a júri popular. Enquanto isso, a discussão se espalha por toda a cidade: até quando equívocos letais vão continuar a ser tratados apenas como erros operacionais?
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